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    O conto do pequeno Édipo


    Suleiman Cassamo - Moçambique

    O HOMEM tamborilou os dedos no balcão. Pediu, com uma voz cinzenta: -Uma cerveja. Pediu como quem pede ao ar. Isto é, sem dar inteira conta nem da mulher de preto, sentado no banquinho, nem do miúdo, jogando guêime. A mulher abriu uma média. O homem ignorou aquela, e apalpou as garrafas no fundo da caixa térmica. O rapazito suspendeu o jogo, e olhou-o com cara de poucos amigos. - Vá brincar lá dentro - berrou a mulher, indicando a saída que dava para o resto da casa. Por sinal a única porta da barraca. O balcão-janela dava para a rua, e estava, assim, o cliente, único àquela hora, de costas para a rua. Decidiu-se pela cerveja que a mulher lhe estendia. Afinal, estava tudo gelado por igual, e a quente, e a sede, tanta, que ele virou o primeiro copo num instante. - Que tal? - perguntou a mulher, tentando animá-lo. Ia já no mar alto da vida. Navegação difícil, pelos vistos. Emanava dela uma discreta tenacidade, a dor sem queixume, a arte de sobreviver. Não há remo mais lesto que o coração feminino. - Que tal, é boa? O homem tinha a língua presa. O humor azedo, ao fim de um dia de trabalho, é coisa normal. Ainda bem; por estes anos, de repente, Deus trocou-nos cogumelos por barraca. Entre o "chapa" e a casa, uma pausa para relaxar. À terceira média, soltou, mesmo a língua, dizendo: - Boa. A mulher parou de acender a vela, e encarou-o. Melhor, encararam-se. À luz
    tremelicante do fósforo, ela surgiu da roupa da viuvez. Era como acender a própria beleza. O menino estava à porta, espiando aquele momento mágico. A mulher virou-se para o garoto. Pela primeira vez, conheceu nele a cólera. - Suca daqui! - ordenou a viúva. Mas o puto voltaria sempre: mãe o meu guêime, mãe: tem um rato dentro da pasta; mãe um refresco; estou com fome, mãe… - Dá-lhe um pacote de "Maria" - disse o cara. E acrescentou, peremptório: - na minha conta. Mas isso, se é que ele não sabia, não o compraria. Quando muito, o seu momentâneo sumiço. À quinta média, o cliente tinha já, não só a língua mas também o espírito solto, um verdadeiro poeta. Mudou-se para o canto do balcão onde à luz da vela, a mulher escolhia folhas de couve para o jantar. Como se o bafo da cevada fosse o suco da própria poesia, cochichou: - Boa como a própria dona? Nisso o menino reentrava. Não gostou daquela súbita intimidade. O peito cheio de ar, incapaz de falar, fixou o cliente com olhos de cobra. - Xixi cama! - berrou o homem. O puto deu um passo em frente. E descarregou os pulmões: - Rua-rua-rua! Pegando num vasilhame, avançou para o balcão. Estava em causa não propriamente o lugar do seu pai, mas o seu próprio. Qual pequeno Édipo, avançou pois, disposto a morrer. Eterno é o labirinto dos afectos, e por isso, estória sem desfecho, esta.
    A prostituta que me provou o teste
    S exta-feira. Na cidade. Meia-noite. Lua cheia. Verão de Dezembro.
    As miúdas alegres na carne masculina que enfileirava a rua delas. Os guardas mais ricos ficavam no aluguer dos sítios.
    Eu (Mbopene), Xiguimane, Muzila vestidos de roupa de passeio descemos a cidade baixa com a ejaculação na mente. Mente esta que estava alcoolizada de tantas garrafas derrubadas no covil da Xitique. Mulher incerta e experiente na arte de vender aos assalariados que mês á mês colhia do cantineiro, do camionista que chegava ao mercado vender hortícolas e legumes, do armazenista que descarregava vagões de produtos contrabandeados, do mulungo do escritório.
    Descemos nos cânticos de alegria e no provoco dos inocentes que cruzaram caminho com os três assalariados.
    Mulheres expostas na rua como se de manequins das lojas fossem caminhavam em direcções incertas a vender o que entre as pernas lhes é sagrada.
    No silêncio dos homens atenciosos e na boca larga do Muzila ouviu-se uma frase grave, aterrorizadora, inerte, grossa, má, que deixou os homens de verdade silenciosos, as mulheres da rua a vociferarem, os seguranças das boates a entrarem na zaragata.
    - Calma ai! Não foi isso que ele queria dizer e não se referia a senhora.
    - A quem dizia, eu ouvi, foi esse cão duma figa que disse.
    - Vais apanhar que nunca viste hoje, nos estão aqui a fazer a vida e tu se não queres nada fica em tua casa. Seu nquenho.
    - Pega ai, e vocês não se metam se não apanham também, leva o gajo para lá em cima. E vocês ficam aqui. Quem seguir apanha, juro mesmo. Este tipo vai aprender.
    Sumiu na escuridão da garagem daquele edifício. Fiquei lúcido. Pensei na polícia. Pensei em fugir. Pensei na milícia. Pensei.
    - Agora vás dizer de novo aqui que disseste na rua ou vás fuder com a malta.
    - Juro que não dizia a vocês.
    Gritos de dor, de tristeza, de amparo. Ninguém ouve. Fraqueza do homem.
    - Tira-lhe as calças e a camisa e a cueca se tiver.
    Nu. Amarrado contra dois postes de canalização de água ali colados a parede. Gritava. A primeira tirou a calcinha. Nua ia ficando. A outra apalpava-lhe o que o homem preserva. Outra metia um lencinho a boca para lhe silenciar. Apalparam-lhe. Acariciaram-lhe. Chuparam-lhe como se de rebuçado fosse.
    Ficou erecto mesmo com dor. Calou-se com lágrimas de medo.
    - Vais dizer mas aqui?
    Silencio mudo.
    A nua segurou-o e introduziu na miúda. Fez movimento que animais em cio, sentiu
    prazeres, gemiam na doçura do acto sexual. Ia perdendo o directo ao medo, ia perdendo o medo a vida, ia ficando com mas prazeres.
    Saiu e entrou a outra, mas brava na arte de satisfazer o cliente mexeu com tudo, sentiu sua vagina delirar, sentiu sua vagina amadurecer, sentiu o pénis fazer-lhe sentir o prazer da vida. Mijou.
    - Agora vai dizer aos teus amigos aquilo que você pronunciou na rua. Saíram de volta ao serviço. Feliz e ele enforcado com o sexo grátis.
    Teve medo de voltar a ver seus amigos, quando no fundo da escuridão ouviu vozes se aproximando em seu auxílio.
    - Então? O que te fizeram Muzila.
    - Sexo sem protecção.
    - Vamos a policia faz queixa, se te transmitiram o sida a força.
    Um ano depois enquanto Muzila cuidava dos seus afazeres, surgiu uma mulher com meia-idade, a cara era linda, o vestuário a medida. Perguntou quando custava o produto olhando para a prateleira ao lado.
    Quando os olhos se cruzaram, Muzila ficou minutos a discernir suas lembranças.
    - Conheço a senhorita de algum lado.
    - Todos me conhecem.
    - Mas não me recordo.
    Pagou a conta e saiu. Minutos depois Muzila seguia para confirmaram o local.
    - Desculpa senhorita, trabalha na baixa da cidade?
    - Onde?
    - Desculpe, na rua!
    - Sim, porquê? Já estivemos juntos.
    Silêncio.
    -Sim, recorda do jovem que a um ano foi obrigado a fazer sexo por ter ofendido três senhoritas e os homens todos ali presentes ajudaram-nas.
    - Sim lembro-me.
    - Sou eu!
    Silencio. Olhares. Perguntas por fazerem-se.
    - Como está?
    - Casada há 6 meses com um estrangeiro e mãe de um bebé de três meses.
    - A tua amiga que também me possuiu.
    - Morreu!
    - De doença?
    - Não foi isso que levou a te possuirmos, de desconfiar que nos éramos umas cheias de SIDA.
    - Foi!
    Poesia e Contos de Autores Africanos moçambicano (n.1962)

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